Terra do Nunca
sábado, 28 de maio de 2011 | Opine aqui

"Não chores, meu filho;
Não chores, que a vida
É luta renhida:
Viver é lutar.
A vida é combate,
Que os fracos abate,
Que os fortes, os bravos
Só pode exaltar."
Gonçalves Dias

Não cresça meu pequeno Peter Pan, não cresça meu querido. Agora te olhando correndo por aí, sorriso no rosto pequeno, te sinto mais feliz do que me lembro de algum dia ter sio. Não cresça que o resto da vida é só desilusão. Não haverão sorrisos soltos em vão. Haverão dias, meses, anos de tristeza. Não cresça que não te quero ver sofrer, que eu também não quero sofrer quando partires e eu me tornar só, que não quero chorar, sofrer mais do que sofro. Não cresça que eu te amo. A tua infância traz em mim de volta qualquer coisa de belo. Te vejo sorrir todos os dias, todas as horas e me fazes sorrir. Por isso não cresça. Te quero aqui, sim, me fazendo sorrir. Vezenquando a tristeza vem de formas inesperadas e tu estás lá sorrindo, rindo da cara da vida, brincando. Te quero assim para sempre - para nunca -, não quero que cresças e ames e bebas e se amargure. Não quero para ti a minha vida. Olho bem dentro destes olgos pequenos de jabuticaba, de gente pequena, te olho dentro dos olhos e não vejo os calos que vejo nos meus todas as manhãs no espelho, não vejo as tristezas, amarguras, porres vividos. Vejo qualquer coisa de belo, qualquer coisa de alegre. Sem antecedentes criminais. Não cresça, a dor se instala como um parasita em nosso peito depois de um tempo, depois que a esperança - e até mesmo o amor-próprio - acaba. Depois da esperança só resta dor. Não cresça. Quero sempre ter perto este rosto que eu já aprendi as vontades, estes sons de choro que apenas significam fome. Não cresça, não quero o som dos choros angustiados, questionando o amor, vomitando vodka tequila esperanças. Não cresça, não quero que sofras, não quero sofrer junto à ti. Pequeno Peter Pan, confesso que não te quero ver partir, sempre do meu lado te quero te, sempres sorriso, quero que sejas sempre meu Peter Pan. Não cresça. A vida é muito dolorosa para ser vivida, é muito insignificante. Continue correndo, continue apenas chorando por foma. Continue apenas sendo Peter Pan, meu pequeno Peter Pan. Fuja para a Terra do Nunca. Não cresça, só brinque, não vá se meter em perigo, não enfrentes piratas com pernas de pau. te amo querido. Te envio agora para a Terra do Nunca onde nunca crescerás, onde nunca saberás como dói um amor perdido, como doem as desilusões, como dói crescer. onde talvez nunca saberás de mim. Não cresça, meu filho, não cresça.


Sussurro
terça-feira, 24 de maio de 2011 | Opine aqui
"Lá onde o infinito
De tão infinito
Nem mais nome tem"
Vinicius de Moraes

Mais alto agora te sinto em meus ouvidos um tanto quanto secos, cansados de não ouvir nada tão bonito, tão perto, em tanto tempo. Sussurras coisas que parecem desconexas como venhas comigo e eu te amo perdidos em meio à tantas palavras.
Eu te poderia reinventar em cada pequeno movimento deste dia e dos anteriores e outros tantos. Eu te poderia ouvir bem perto. Eu te poderia sentir. Mas nada faço - o som das desconexas palavras que sussurras contra meus ouvidos secos amargos antigos - em meu pensamento. Sou nada, sou nada perto da tua voz ofegante em momento de ternura. Sou nada mais que ouvido rascante seco perdido. Sou nada mais que pensamento.
E te penso. Somos um só. E me pensas.
Tanto amor transborda as veias e extravasa os vasos linfáticos saindo para fora de nós em luz, brilho ou qualquer coisa. Tanto amor que é impossível. Abstrato. Sinto. Sentimos.
Continuas os sussurros: amor, venha comigo, te amo tanto tanto. Qualquer coisa que me faça feliz, que minta extidão, realidade. E finges. E acredito. E não finges também. Ainda, em alguma parte alguma, acredito tanto em ti, acredito em teu amor impossível. Nosso. E somos felizes. Eu que por tanto tempo - quanto tempo! - fui triste. Não sou mais. Rio. Sinto sussurros contra meu ouvido seco de ilusões perdidas contra minha mente de amores e pensamentos.
Te sinto em meu rosto, contra meu rosto, beijando minhas faces - agora rosadas - beijando meus lábios. Te sinto em meus braços. Te sinto.
Sussurro após sussurro vamos desparecendo em nós mesmos, infinitos. Transborando amor e frases-feitas: te amo te amo te amo. Nos derramamos em amor. Nos derramamos em luz. O amor brilha.
Sentimos quietos, lânguidos, límpidos.
Em amor - meu amor- sumimos. Com a intensidade de um sussurro.


Walking With a Ghost
quarta-feira, 11 de maio de 2011 | Opine aqui

EM PARCERIA COM JÉSSICA C. R.
"No matter wich way you go
No matter witch way you stay"
Tegan & Sara

Acordo.
A primeira coisa que faço, antes mesmo de levantar, é sentir o bafo da noite anterior: conhaque, cachaça, cigarro e o gosto de outras bocas se misturam com meu cheiro próprio mesclando-me em mim mesmo com outros e outras, e alcool, e cigarro. O cheiro da festa ainda está em mim. Cheiro arisco.
Levanto.
Completamente nu me encaminho para o banheiro e me olho no espelho: olheiras profundas em rosto jovem precocemente envelhecido, lábio inchado, roxo no lado esquerdo do pescoço, pele seca, cabelos já rareando.
Sinto um nojo de mim, uma necessidade absurda de choro, de cólica, de me dobrar sobre meus próprios joelhos em posição fetal deitado no chão do banheiro balbuciando coisas sem sentido como "venha comigo para o reino das ondinas me ame vamos fugir eu preciso tanto ser amado tanto tanto". Venha comigo.
Agora abraço o vaso do banheiro vomitando tudo de ruim que existe em mim: conhaque vodka carmas sonhos e esperanças. Tudo sai, vai sendo tragado pelo vaso depois que puxo a descarga.
Pela janela do banheiro consigo ver o céu lá fora, os céus de domingos de verão sempre são assim por aqui: azuis, sem nuvem alguma, é alguma convenção de Deus para fazer os bêbados ainda mais miseráveis. Sinto-me menor perto do céu azul, contrastando com o cinza dentro de mim.
Agora já não estou mais agarrado ao vaso e sim encostado à parede do banheiro: choro. Não há porque conter o choro, não agora que todos já se foram, todos já partiram, todos já choraram. Só restou eu, só restou eu com essa grande dor, não há porque não chorar.
As desilusões as marcas os poços os abismos as perdições que ficaram em mim, meu Deus, faz tanto tempo, tanto tempo que tento livrar-me disso tudo. Tanto tempo que tento me libertar. Nem o choro nem o vômito nem a festa do dia anteriro me bastam. Preciso de algo maior, algo bem maior, que me venha, e me leve, e me arrebate pelos caminhos incessantes, pelos caminhos incessantes que levam à Roma. Preciso sair deste mundo infeliz, preciso parar de ser infeliz para passar por essa grande dor.
Três dias sem parar foi o que ele disse, "eu chorei três dias sem parar", depois ficou daquele jeito feliz, descontraído. Tento me fazer crer que não preciso disso, chorar, chorar até ficar com dó de mim, não, tento me fazer crer que o que eu preciso é fugir, encontrar alguém que queira fugir comigo para o reino das ondinas ou Atenas, Creta, Roma, Paris - nós sempre teremos Paris - preciso de alguém. Para passar por esta grande dor.
Quem sabe eu só precise mesmo de um bom choro, três dias trancado no quarto sem esperança e depois ressucitar: feliz, descontraído, desapegado de tudo e até de mim mesmo. Quem sabe eu precise me desapegar. Encostado na parede do banheiro vou me esquecendo, me esquecendo, me esquecendo.
Durmo, incompleto durmo.
Ai as vidas gentes conhaques que passaram por mim, tudo isso ainda reside em minha boca.

PARTE 2:
Me deparo com uma imensidão de cores. Todas as pessoas, que passaram por minha vida, estão aqui. Flutuando em nuvens rosas, azuis, vermelhas, laranjas. Eu as observo e, elas percebem. Então acenam com a cabeça, mostrando-me a direção a qual seguir e, sem hesitar, o faço. Vou com as nuvens, flutuando. Vou com sonâmbulos e corsários, poetas, astrólogos e a torrente de mendigos perdulários. Me perco na imensidão, nas cores que jorram da cachoeira, que jorram das nuvens, das pessoas, dos pensamentos. Frases flutuam ao meu redor.
'Amar a nossa falta mesma de amor, e na secura nossa, amar (...).'
Então acordo.
Com o gosto do sonho, das cores, das frases, das pessoas. O resto está fora de mim, fora do meu alcance. Caminho; com um fantasma... talvez ele sempre estivesse junto a mim fazendo-me lembrar da noite anterior. Das noites anteriores.
O fantasma é o medo; a ilusão; a esperança; os conhaques; as pessoas; as vidas. O fantasma sou eu, ou o que eu me tornei: um fantasma perante os outros, incompleto, melancólico, bêbado, boêmio.
Um escritor com o gosto das noites anteriores. Na boca.


Seja o que for

"Onde queres o ato, eu sou o espírito e onde queres ternura, eu sou tesão. Onde queres o livre, decassílabo e onde buscas o anjo, sou mulher. Onde queres prazer, sou o que dói e onde queres tortura, mansidão. Onde queres um lar, revolução e onde queres bandido, sou herói" Caetano

O blog

Para Jéssica,
porque "o que obviamente não presta
sempre me interessou".

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Soneto de Fidelidade

"De tudo ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.

Quero vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento.

E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama

Eu possa dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure."